Diz que era uma vez um homem que tinha tantos filhos que não
achava mais quem fosse seu compadre. Nascendo mais um filhinho, saiu para
procurar quem o apadrinhasse e depois de muito andar encontrou a Morte a quem
convidou. A Morte aceitou e foi a madrinha da criança. Quando acabou o batizado
voltaram para casa e a madrinha disse ao compadre: - Compadre! Quero fazer um
presente ao meu afilhado e penso que é melhor enriquecer o pai. Você vai ser
médico de hoje em diante e nunca errará no que disser. Quando for visitar um
doente me verá sempre. Se eu estiver na cabeceira do enfermo, receite até água
pura que ele ficará bom. Se eu estiver nos pés, não faça nada porque é um caso
perdido. O homem assim fez. Botou aviso que era médico e ficou rico do dia para
a noite porque não errava. Olhava o doente e ia logo dizendo: - Este escapa! Ou
então:
- Tratem do caixão dele! Quem ele tratava, ficava bom. O
homem nadava em dinheiro. Vai um dia adoeceu o filho do rei e este mandou
buscar o médico, oferecendo uma riqueza pela vida do príncipe. O homem foi e
viu a Morte sentada nos pés da cama. Como não queria perder a fama, resolveu
enganar a comadre, e mandou que os criados virassem a cama, os pés passaram
para a cabeceira e a cabeceira para os pés. A Morte, muito contrariada, foi-se
embora, resmungando. O médico estava em casa um dia quando apareceu sua comadre
e o convidou para visitá-la. - Eu vou, disse o médico - se você jurar que
voltarei! - Prometo! - disse a Morte. Levou o homem num relâmpago até sua casa.
Tratou muito bem e mostrou a casa toda. O médico viu um
salão cheio- cheio de velas acessas, de todos os tamanhos, uma já se apagando,
outras vivas, outras esmorecendo. Perguntou o que era: É a vida do homem. Cada
homem tem uma vela acessa. Quando a vela acaba, o homem morre. O médico foi
perguntando pela vida dos amigos e conhecidos e vendo o estado das vidas. Até
que lhe palpitou perguntar pela sua. A Morte mostrou um cotoquinho no fim. -
Virgem Maria! Essa é que é a minha? Então eu estou, morre-não- morre! A Morte
disse: - Está com horas de vida e por isso eu trouxe você para aqui como amigo,
mas você me fez jurar que voltaria e eu
vou levá-lo para você morrer em casa.
O médico quando deu acordo de si estava na sua cama rodeado
pela família. Chamou a comadre e pediu: - Comadre, me faça o último favor.
Deixe eu rezar um Padre-Nosso. Não me leves antes. Jura? - Juro -, prometeu a
Morte. O homem começou a rezar o Padre-Nosso que estás no céu... E calou-se.
Vai a Morte e diz: - Vamos, compadre, reze o resto da oração! - Nem pense
nisso, comadre! Você jurou que me dava tempo de rezar o Padre-Nosso, mas eu não expliquei quanto tempo vai durar
minha reza. Vai durar anos e anos... A Morte foi-se embora, zangada pela
sabedoria do compadre.
Anos e anos depois, o médico, velhinho e engelhado, ia
passeando nas suas grandes propriedades quando reparou que os animais tinham
furado a cerca e estragado o jardim, cheio de flores. O homem, bem contrariado
disse: - Só queria morrer para não ver uma miséria destas!... Não fechou a boca
e a Morte bateu em cima, carregando-o. A gente pode enganar a Morte duas vezes,
mas na terceira é enganado por ela.
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